quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Fevereiro de 2013 - PEPETELA


 
Encontro n°52 - 5/03/2013 

 
 
O PLANALTO E A ESTEPE
 
 
 
 
 

 
O Planalto e a estepe é um romance de leitura rápida e prazerosa.
Pepetela conta a história de amor entre dois estudantes: Julio, um jovem revolucionário de Angola, e Sarangerel, a filha do Ministro de Defesa da Mongólia.
Um amor que nasce em Moscú, na década do sesenta.
 
O Planalto e a Estepe es una novela de lectura rápida y placentera.
Pepetela cuenta la historia de amor entre dos estudiantes: Julio, un joven revolucionario de Angola, e Sarangerel, la hija del Ministro de Defensa de Mongolia.
Un amor que nace en Moscú, en la década del sesenta.
 
A primeira parte do livro, Os Rochedos de Tundavala, prende ao leitor pela beleza de sua narrativa poética.
La primera parte del libro, Os Rochedos de Tundavala, es atrapante por la belleza de su narrativa poética.
 
“Os olhos dele continham o céu do Planalto.
Na Huília, Serra da Chela, Dezembro, quando o azul mais fere.
Nos olhos dela estavam gravadas suaves ondulações da estepe mongol.
Tons sobre o castanho.
Entremos primeiro no azul.

A minha vida se resume a uma larga e sinuosa curva para o amor.”
 
O autor vai arredondado as ideias por meio de frases curtas:
El autor va redondeando las ideas por medio de frases cortas:
 
“As saudades não vencem o medo.” (Pag. 20)
 
“As palavras pesam como o ouro. Porém, algumas brilham com a sua clareza.” (Pag. 25)
 
“Quando se faz o endesejado só resta sonhar.” (Pag. 28)
 
O romance se constrói sobre fatos verídicos que transcorrem durante a Guerra Fria até alguns anos posteriores à extinção da União Soviética: centrando-se na expansão do socialismo, e na luta da libertação de Angola,
 junto a outros países da África.
 
La novela se construye sobre hechos verídicos que transcurren durante la Guerra Fría hasta algunos años posteriores a la extinción de la Unión Soviética: centrandose en la expansión del socialismo, la lucha de liberación de Angola junto a otros países africanos.
 
Pepetela, que foi guerrilheiro do Movimento Popular de Libertação Angolana, reflete sobre a hipocrisia dos governos socialistas e sobre
quanto influem as questões políticas na liberdade individual.
 
Pepetela, que  fue guerrillero del Movimiento Popular de Liberación Angolana, reflexiona sobre la hipocresía de los gobiernos socialistas y sobre
cuánto influyen las cuestiones políticas en la libertad individual. 
 
“Não vejo nenhum responsável angolano ir passar férias a URSS ou a um país socialista. Talvez um o outro vá a Cuba, mas mesmo assim é raro. Vão ao Brasil ou Portugal, ou a França e Itália, países capitalistas, e alguns chegam mesmo a ir à Inglaterra e Estados Unidos, países imperialistas. Porque não vão gastar os vossos dólares nos países amigos?” (*)
 
“Não construímos a sociedade do futuro, nem a mais justa, como prometemos aos povos do mundo. Antes pelo contrário, criamos tremendas injustiças em todos os países onde tentamos espalhar a revolução, na Europa ou fora dela. Nós soviéticos vamos pagar caro, mais caro que os outros. O sistema não vai aguentar, estoira por algum lado, só não sei quando.”
 
Alguns leitores, trás navegar em tantas páginas de guerras e conflitos internacionais surpreenderam-se com o desenlace simples e feliz, do tipo "conto de fadas", do livro.

Algunos lectores tras navegar en tantas páginas de guerras y conflictos internacionales se sorprendieron con el desenlace simple y feliz, del tipo “cuento de hadas”, del libro.
 
O Planalto e a Estepe é um romance que se desfruta página a página.
Foi um gosto descobrir a literatura de Pepetela!
 
O Planalto e a Estepe es uma novela que se disfruta página a página.
Fue un gusto descubrir la literatura de Pepetela!
 
 
(*) O romance de este mês, publicado em 2009, ainda não foi traduzido ao espanhol. Por essa razão, os trechos do livro copiados no blog estão só em português. La novela de este mes, publicada en 2009, todavía no fue traducida al español. Por esta razón las frases del libro copiadas en el blog están solo en portugués.  
 
 
Trechos do livro:
 
"O tempo é um atleta batoteiro, toma drogas proibidas, corre mais que todos. E quanto mais o quisermos agarrar, porque resta pouco, mais ele corre. Por isso são sábios os velhos dos kimbos, nunca querem agarrar o tempo, deixam-no passar por eles, as peles devem ser rugosas e o tempo entranha-se nelas, deslizando com mais dificuldade. Entranha-se mesmo nas peles das mulheres velhas tratadas diariamente com leite coalhado e óleos tirados de sementes especiais para ficarem macias. Se elas usam a sabedoria dos anciãos, as peles lisas pelo leite e óleo têm no entanto entalhes, escarificações, travando a corrida do tempo.
Nós achamos ser superiores, modernos, vivemos em cidades, porém não sabemos nada disto. O tempo goza com a nossa estúpida vaidade, passa por nós como um foguete, nos torna seus escravos.”

“A cabeça cresce com as verdades que nela entram.” (Pag. 24)

“Quando a gente é pequena, só o dinheiro faz horizontes se abrirem.” (Pag. 31)

“A juventude merece perdão pela sua credulidade.” (Pag. 37)

“Como constataria mais tarde na minha penosa existência, os fiéis deixavam de o ser ao estudarem marxismo e comunismo e enquanto lhes convinha. Mas tempos depois, desiludidos com a vida, abandonavam o marxismo. E regressavam às religiões. Acontecia por vezes de não ser a religião de origem, mas era de qualquer modo uma religiião. Fraquezas, medos, interesses, sei lá.
Não é fácil viver sem Deus.” (Pag. 36)

“Eu tinha vontade de chorar, mas os olhos estavam secos, cheios de visões de desertos. Antevia coisas? Sabia, a vida nunca mais seria igual. Acontecesse o que acontecesse, era um passo definitivo, um mudar de página. Há gente que não se apercebe de quebras de tempo ou de espaço. Ou de vida. Ali estava uma fenda tão grande como a Tundavala. Mas era uma fenda na minha vida. Adivinhava. Por isso os olhos secos. Lagrima-se quando um acontecimento tapa a visão, a dor domina o cérebro, as barreiras permanecem obscurecendo tudo. Então as águas saem, se soltam na escuridão. Quando uma pessoa adivinha o que está para vir, os olhos desfilam sobre desertos, pedras, planuras, florestas ou estepes, pinturas pontilhistas, aquilo que se sabe estar perdendo corre mais rápido que o tempo. Sensação de perda, olhos na planície ondulando.”  (Pag. 26)

“Mal conseguia balbuciar um bem-vinda. Muito menos bem-vinda, amor. A primera vez que lhe chamei querida, a palavra me tinha queimados os lábios. E deve ter destruido os tímpanos dela. Depois perdeu a força, com a rotina, ja não fazia os mesmos estragos na boca de um e no ouvido da outra.
As palavras carinhosas são infelizmente amansadas pelo tempo.” (Pag. 56)

“A onça deixada para trás no nosso trajeto de humanização nunca se dilui completamente dentro de nós, por muitos livros lidos, viagens feitas ou debates intelectuais participados. Existe sempre uma unha ou dente de onça que se manifesta quando a ocasião é propícia. Somos considerados civilizados se somos capazes de o esconder sempre do conhecimento dos outros. Mas existe todavia um pedaço selvagem permanecendo de atalaia. E ao menor pretexto damos o bote.
Somos uma humanidade animal.”  (Pag. 121)

“As saudades voltam desde o momento que deixamos o sítio ou o ente amado.” (Pag. 144)

“Não há amor resistente à solidão.” (Pag. 148)

“Quando o futuro se tornou porta de pedra
Respira fundo devagar devagar
Como os grandes peixes em águas profundas.
Sê tu próprio o teu respirar.

A porta se abriu. O segurança mandou entrar. Ouvi cerrar-se a porta atrás de mim mas nem percebi. Ouvi apenas. Porque pensar, reconhecer, perceber, reparar se tinham tornado ações impossíveis: Sarangerel estava à minha frente.
Morri ou renasci? Haverá diferença?
Não havia dor. Não havia sensações. Apenas um rosto redondo, sorrindo timidamente, mas sem os olhos baixados. Os olhos castanhos fitavam os meus e nunca os enti tçao azuis. Foi só isso, a sensação de ter olhos azuis no meio do castanho.”
(Pag. 153)


Ele respirou fundo como os grandes peixes
Deu voltas frenéticas nas águas profundas
Respirou devagar devagar
Enovelou o suspiro no espíritu
Rompeu de pedra a porta
Ousou enfim olhar o futuro.
Existia. 
(Pag.169)
 
 
Fenda de Tundavala, Angola. 

 
 
 
PEPETELA
 
Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, conhecido pelo pseudónimo de Pepetela nasceu em Benguela, em outubro de 1941. É Licenciado em Sociologia é docente da Faculdade de Arquitetura da Universidade Agostinho Neto em Luanda. A sua obra reflete sobre a história contemporânea de Angola e os problemas de sua sociedade.  Foi guerrilheiro pelo Movimento Popular de Libertação de Angola, político e governante. 
Ganhou o Prêmio Camões  em 1997.
 

Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, conocido por el sobrenombre Pepetela nació en Benguela, en octubre de 1941. Es licenciado en Sociología y docente en la Facultad de Arquitectura de la universidad Agostinho Neto en Luanda. Su obra reflexiona sobre la historia contemporánea de Angola y los problemas de su sociedad. Pepetela fue guerrillero por el Movimiento Popular de Liberación de Angola, político y gobernador.
Ganó el Premio Camões en 1997.
 
 
 
**********************************************
 
 
Lembrancinha do encontro:
 
PROMESSA - Crônica de Antonio Prata, 2007

“Há alguns dias, Deus – ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus – enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor.”
Caio Fernando Abreu
 

Quando cheguei ao bar e a vi, rodeada de rostos conhecidos; quando sentei, sorrindo, depois de dar oi a todos e falando alguma dessas bobagens que a gente fala ao chegar, e os outros riem, e nos sentimos acolhidos na turma de cinco amigos em meio a dezoito milhões de desconhecidos; não percebi o que estava para acontecer. Achei-a bonita, ponto. E pensei – no momento em que puxava a cadeira para sentar-me – quem é essa moça bonita que eu não conheço, em meio aos outros que conheço tanto?
A primeira impressão é a que fica -- para trás. Pelo menos no meu caso. A imagem inicial que tenho de pessoas e lugares não tem nada a ver com a que se constrói depois de um tempo. Se naquele momento me perguntassem, portanto, o que eu achava da menina bonita, não iria me derreter em superlativos. Mas quando ela sorriu pela primeira vez, e a curva do sorriso foi abrindo caminho pelas bochechas e apontando para cima, em direção a dois olhões pretos e inteligentes, pensei assim: eu poderia amar essa mulher.
Não, não foi amor à primeira vista. Eu não estava loucamente atraído por ela, nem apaixonado. Não senti vontade de pular em cima e beijá-la imediatamente, nem aquela afobação que a gente já não sabe se é desejo ou consumismo, tipo: preciso dela imediatamente. Eu estava calmo. O amor é calmo.
Eu seria uma besta se dissesse que vi nos olhos dela a mesma perspectiva. Não vi. Aliás, mulher não é assim tão boba de dar bola em cinco minutos de conversa. O que reparei foi que ela me olhava curiosa: quem é esse cara que chegou? O que ele faz? O que ele pensa das coisas? E não houve uma frase que eu tenha dito aquela noite, um gesto que eu tenha feito, que não tenha sido, mesmo que indiretamente, para ela. Tomei cuidado para não deixar transparecer. (Nada menos atrativo, ao errarmos na dose, que o desejo). Mas ela soube -- e vi que gostou daquela atenção, tão exagerada quanto disfarçada.
Desculpe dizer, impaciente leitora, que não aconteceu nada de concreto. Nem beijos, nem champanhe, arranhões ou lençóis. Alguns chopes, algumas risadas arrancadas à fórceps com minhas piadas (e comemoradas como gols do Brasil, internamente) e, tenho certeza – no final eu tive certeza – uma mútua promessa de amor.
Eu poderia contar outras histórias, mais felizes e intensas, mas não valeriam à pena. Nós inflacionamos a felicidade. Ela está por aí, gasta, em propagandas de Campari, em outdoors de pasta de dentes, em livros, filmes, melodias e novelas das seis. Nenhuma felicidade real chega aos pés dessa que criamos. A única felicidade possível, acredito, é a promessa de felicidade. Já não há mais espaço para happy ends. Só para happy beginings. Esse é o meu. Foi ontem que conheci essa mulher.
 
Não tenho a menor idéia do que pode acontecer, mas agradeço à vida por ter me enviado esse “presente ambíguo: uma possibilidade de amor” (...)
 
“Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.”

 
 
 

5 comentários:

  1. "O tempo é um atleta batoteiro, toma drogas proibidas, corre mais que todos. E quanto mais o quisermos agarrar, porque resta pouco, mais ele corre. Por isso são sábios os velhos dos kimbos, nunca querem agarrar o tempo, deixam-no passar por eles, as peles devem ser rugosas e o tempo entranha-se nelas, deslizando
    com mais dificuldade. Entranha-se mesmo nas peles das mulheres velhas tratadas diariamente com leite coalhado e óleos tirados de sementes especiais para ficarem macias. Se elas usam a sabedoria dos anciãos, as peles lisas pelo leite e óleo têm no entanto entalhes, escarificações, travando a corrida do tempo.
    Nós achamos ser superiores, modernos, vivemos em cidades, porém não sabemos nada disto. O tempo goza com a nossa estúpida vaidade, passa por nós como um foguete, nos torna seus escravos.”
    O Planalto e a Estepe, de Pepetela, pág.13 )

    ResponderExcluir
  2. A onça deixada para trás no nosso trajeto de humanização nunca se dilui completamente dentro de nós, por muitos livros lidos, viagens feitas ou debates intelectuais participados. Existe sempre uma unha ou dente de onça que se manifesta quando a ocasião é propícia. Somos considerados civilizados se somos capazes de o esconder sempre do conhecimento dos outros. Mas existe todavia um pedaço selvagem permanecendo de atalaia. E ao menor pretexto damos o bote.
    Somos uma humanidade animal".
    ( O Planalto e a Estepe-Pepetela ,pág.121 )

    ResponderExcluir
  3. O PLANALTO E A ESTEPE – Pepetela

    Enquanto lia, pensava na situação utópica, ideológica que qualquer regime político passa para um cidadão. A luta pela tal liberdade, socialista ou não. Jovens sonhadores pela pátria melhorada. Intrínseco, caro(a) amigo(a). Mas quando a individualidade passa a ser atingida, percebe-se que os discursos não têm valor na dimensão proposta. Dois jovens, por serem de países diferentes, "não amigos”, são proibidos de casar. Justificável para países que buscam a tal liberdade?

    Além desses questionamentos, ficam outros (por que a força do amor se perde no tempo?), que reconheci nas palavras do livro:

    Pag. 51:
    “Pobre é o amor
    Que pode ser contado. “(William Shakespeare).

    Ou
    Pag. 52:
    “Que há de verdade no amor? A mesma verdade que existe na verdade. Se consome pelo uso. Ou se reforça pela ausência. Ou nem uma coisa nem outra. O mistério permanece e nos espanta sempre.”

    Pag. 56
    A primeira vez que lhe chamei querida, a palavra me tinha queimado os lábios. E deve ter destruído os tímpanos dela. Depois perdeu a força, com a rotina, já não fazia os mesmos estragos na boca de um e no ouvido da outra.
    As palavras carinhosas são infelizmente amansadas pelo tempo.

    ResponderExcluir
  4. Antes que me esqueça: preciso aprender russo.

    "Pelos lábios dela as palavras saíam molhadas, sobretudo quando tinham éles, e os labios abriam ao pronunciar o ié da letra E, a língua rosa a vislumbrar-se lá no fundo. Sim, Ludmila obrigava-nos a amar a língua russa e a fazer amor com ela e nela. Faltava ocasião."

    ResponderExcluir
  5. Prezada Gabriela,

    Seguindo a sugestão do Nosso Clube li o livro do Pepetela, O Planalto e a Estepe e me encantei com sua maneira de escrever, suas ideias, o conhecimento que trouxe de outros paises e costumes, alem da linda historia de amor entre os jovens.

    Por tudo isso, estou te escrevendo para agradecer a oportunidade de conhecer um autor tão bom pois, sem a informaçao de vcs eu provavelmente jamais teria lido nada dele.
    Muito obrigada.

    Mirian

    ResponderExcluir

Escriba su comentario, haga Click en NOME/URL (Nombre), detalle su nombre y gaha Click en PUBLICAR COMENTARIO.
Para deixar um comentário, após escrevê-lo, escolha a identidade NOME/URL, escreva seu nome e clique em PUBLICAR COMENTÁRIO.